A sonegação fiscal é um dos grandes empecilhos ao combate da desigualdade social no Brasil. A sonegação, aliás, tira um valor muito maior dos recursos públicos do que a corrupção. O problema ainda tem pouco espaço no debate público e, por isso, há em curso uma estarrecedora tentativa de afrontar os princípios constitucionais que protegem o sistema tributário brasileiro.
Tramita na Câmara dos Deputados, um projeto que beneficia sonegadores, possibilitando que eles atuem com impunidade, em detrimento da arrecadação pública. E os maiores prejudicados por esse empreendimento são os bons contribuintes.
O Projeto de Lei Complementar (PLP) nº 17/22 foi protocolado na Câmara dos Deputados, em março, com a alcunha de “Código de Defesa do Pagador de Impostos”. Mas, na prática, o PLP dificulta a fiscalização dos sonegadores ao criar obstáculos para o trabalho dos servidores do fisco. Não é à toa que o projeto vem sendo chamado de “Código de Defesa do Sonegador” nos bastidores — vários dos dispositivos presentes no texto vem sendo criticados pelos profissionais e estudiosos da área, que apontam para as brechas e inseguranças jurídicas que o PLP apresenta.
Um dos pontos mais prejudiciais do PLP 17/22 é a proibição ao bloqueio, suspensão ou cancelamento da inscrição do contribuinte antes do longo e moroso processo administrativo. Se aprovado, o projeto permitirá que organizações criminosas abram empresas de fachada para esconder diversas operações ilícitas e perigosas, atuando assim por anos e anos, com o fisco de mãos atadas para prevenir a ocorrência dessas atividades fora da lei.
É um perigo para os consumidores, que esperam e merecem comprar produtos de qualidade. Mas, com os entraves de fiscalização propostos pelo PLP 17/22, o resultado é um aumento na entrada de mercadorias sem o devido controle, apresentando graves riscos à saúde, à segurança e ao meio ambiente.
Para os empreendedores que se esforçam diariamente, trabalhando para construir um futuro melhor e com todos os tributos pagos em dia, o PLP 17/022 também é uma ameaça. Ao dificultar a fiscalização, o projeto beneficiará as empresas que sonegam impostos e concorrem deslealmente com os negócios legítimos.
O PLP 17/22 também traz prejuízos para os gestores públicos e parlamentares, afinal, com a queda na arrecadação viria uma queda nos recursos públicos destinados à realização de obras de infraestrutura e melhorias em escolas e hospitais.
E se ainda parece muito abstrato, há uma comparação que deixa cristalino o absurdo do PLP 17/22. Quem furta energia ou água com a prática conhecida como “gato” gera prejuízo para os vizinhos que pagam pelos serviços corretamente, não é mesmo? Da mesma forma, quem sonega impostos onera o resto da sociedade.
Fica evidente, pois, que os impactos desse projeto, se aprovado, serão sentidos em todas as esferas da sociedade. O prejuízo na arrecadação de fato gera um estrondoso efeito cascata na segurança pública, saúde, educação e infraestrutura de municípios de todo o país. É preciso prestar atenção ao risco que esse projeto traz para todo o sistema tributário, que ficará ainda mais longe de exercer o seu papel na diminuição da desigualdade social.
Fonte: Metrópoles