O projeto de lei complementar 17/2022 apresentado pelo deputado Felipe Rigoni (União Brasil/ES), em março deste ano, corre o risco de ser votado sem discussão com a sociedade devido à aprovação de um requerimento de tramitação em regime de urgência.
A proposta coloca obstáculos à tributação de grandes contribuintes, à repressão das empresas de fachada, conhecidas como “laranjas”, impede o exercício do papel normativo e regulador pelas administrações tributárias e a autonomia técnica de suas autoridades, entre outros retrocessos que poderão comprometer a arrecadação tributária e o financiamento de políticas públicas no país.
O PLP 17/2022 se apresenta como iniciativa legislativa para defender interesses dos contribuintes. No entanto, um código que impeça a fiscalização de atuar não defende contribuintes, mas, ao contrário, faz com que os contribuintes paguem mais para suprir as manobras de quem não quer pagar.
O projeto reproduz direitos e limites de atuação da administração tributária, que já estão previstos na Constituição, no Código Tributário Nacional e nas normas que regulamentam os tributos. Desse modo, onde poderia acrescentar proteção aos contribuintes, os ofende, pois ao criar amarras para a atuação dos agentes tributários prejudica os que realmente pagam, a quem caberá uma fatia maior na repartição do custeio Estatal. Além disso, gera prejuízos aos destinatários de serviços públicos, que certamente sofrerão com as dificuldades de financiamento decorrentes dessa proposição.
Sustentada por uma estrutura tributária regressiva que onera quem tem menos capacidade econômica, a injustiça fiscal é agravada pela sonegação enquanto um mecanismo de aprofundamento das injustiças e dos privilégios de quem tem maior capacidade contributiva.
Após uma análise do PLP 17/2022, os signatários desta nota conjunta identificaram alguns dos dispositivos capazes de gerar danos irreparáveis ao interesse público, conforme elencado abaixo:
. veda à Fazenda Pública formular atos normativos vinculantes que produzam efeitos ao sujeito passivo da relação tributária (inciso VI do artigo 25);
. limita a atuação do Fisco ao estabelecer que o pertencimento a um mesmo grupo econômico não enseja a solidariedade tributária, e veda a caracterização de grupo econômico ou confusão patrimonial por presunção, dentre outros, favorecendo arranjos societários destinados a evadir e elidir tributação (artigo 17);
. condiciona a desconsideração da personalidade jurídica à decisão judicial nas hipóteses de abuso de direito, excesso de poder, infração da Lei, fato ou ato ilícito, favorecendo a utilização de “empresas laranjas e de fachada” (artigo 29);
. veda à Fazenda Pública fazer-se acompanhar pela força policial em diligências, salvo em caso de autorização judicial (inciso IV do artigo 25);
. extingue definitivamente o voto de qualidade nos casos de empates no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) (artigo 35 e inciso III do artigo 36); Nota Conjunta referente ao PLP 17/2022 Página 2 de 2
. impede a Fazenda Pública de bloquear, suspender ou cancelar a inscrição de contribuinte antes de decisão terminativa em processo administrativo do CARF (inciso II do artigo 25);
. impõe sigilo bancário à Fazenda Pública, impedindo-a de verificar a veracidade dos registros das transações bancárias escrituradas em sua contabilidade. Essa verificação só poderia ser feita após o encerramento do processo administrativo, comprometendo a fiscalização e favorecendo a sonegação de tributos (artigo 28).
Os exemplos apontados acima demonstram que o PLP 17/2022 esvazia e restringe a capacidade da administração tributária de combater a sonegação e outros ilícitos, blindando mal pagadores, facilitando a inadimplência fiscal e estimulando a concorrência desleal. Considerando os efeitos inevitáveis de queda da arrecadação fiscal, a proposta em discussão na Câmara dos Deputados compromete o financiamento dos serviços públicos e contribui para o crescimento da desigualdade econômica e da injustiça fiscal no país.
Diante do risco apresentado para o Estado e para os contribuintes que pagam corretamente os tributos que devem, faz-se necessário, então, reverter a tramitação em regime de urgência. Além de promover um amplo debate com os setores organizados da sociedade por meio de audiências públicas na Câmara dos Deputados e nas Assembleias Legislativas.
As entidades representativas dos Fisco nos âmbitos federal, estadual e municipal reiteram os compromissos com a ampliação das redes de atendimento fiscal, com o fortalecimento da administração tributária, com os mecanismos que garantam maior agilidade e efetividade à cobrança dos tributos e com o cumprimento da legislação tributária.